Fragmentos afetivos da minha história
Por: Profa. Dra. Stânia Nágila Vasconcelos Carneiro
Esses ícones não eram apenas rostos na televisão; eles eram parte das nossas famílias. Eles entravam em nossas casas, semana após semana, com suas vozes familiares, trazendo alegria, entretenimento e, muitas vezes, lições de vida. Cada programa, cada riso, cada música, moldou quem somos, unindo gerações ao redor de uma mesma emoção.
No entanto, à medida que o tempo passa e essas figuras se vão, percebemos que não são apenas elas que nos deixam, mas também uma parte de nós. As risadas que ecoavam nas salas de estar, os bordões que repetíamos com entusiasmo, os momentos que pareciam tão simples e corriqueiros, hoje são lembranças que nos aquecem o coração, mas também nos fazem sentir a saudade.
Quem não lembra do velho guerreiro!? Os bordões do Chacrinha são mais do que simples frases; eles carregam consigo uma avalanche de memórias afetivas que me transportam imediatamente para as tardes despreocupadas de sábado. Ao ouvir “Quem não se comunica, se trumbica!”, “ Roda, roda e avisa…”, sinto o calor daquela sala de estar onde, com meus pais e meus irmãos reunidos, ríamos e nos deixávamos levar pela irreverência do Velho Guerreiro. Cada grito de “Terezinhaaa!” era um convite ao riso e à alegria simples, que ecoava pelas paredes da casa e nos conectava, ainda que por alguns momentos, a uma comunidade maior, unida pela televisão. Esses bordões não eram apenas palavras; eram parte do ritmo das nossas vidas, um alicerce de lembranças que hoje aquecem meu coração e trazem de volta a leveza e a magia de um tempo que não volta mais, mas que permanece vivo em mim.
As noites de segunda-feira tinham um brilho especial quando a Hebe Camargo entrava em minha casa, com seu sorriso largo e sua presença inconfundível. Os bordões e a irreverência da Hebe eram como um sopro de autenticidade em um mundo que, às vezes, parecia inflexível e previsível. “Que gracinha!” – ela dizia, e era impossível não sorrir junto, sentindo que, por mais simples que fosse o gesto ou a palavra, havia ali um reconhecimento genuíno, um carinho que ultrapassava a tela.
A irreverência da Hebe era outra marca registrada que eu adorava. Ela não tinha medo de falar o que pensava, de rir de si mesma, e, ao fazer isso, me ensinava a não levar a vida tão a sério, a encontrar leveza mesmo nas situações mais complicadas. Suas “bijoux” gigantes, sua roupa colorida e brilhosa (Um luxo!), suas risadas estrondosas e seus abraços calorosos faziam parte de um espetáculo que era tão íntimo quanto grandioso. Hebe falava como se fosse uma velha amiga, sem rodeios, sem filtros, e isso criava uma conexão única, como se, de alguma forma, eu tivesse o privilégio de estar naquele sofá branco ao seu lado.
Esses momentos com Hebe eram mais do que entretenimento; eram um convite para eu ser eu mesma, para celebrar a vida com todas as suas imperfeições e surpresas. Ela me mostrou que a elegância não está apenas nas palavras polidas, mas na capacidade de ser verdadeira, de rir e de fazer rir, de abraçar a vida com todo o seu caos e beleza. Hoje, ao lembrar da Hebe e de seus bordões, sinto uma saudade profunda, misturada com uma gratidão por ter crescido ouvindo suas palavras, que continuam ecoando no meu coração como um lembrete constante de que a vida é, acima de tudo, uma “gracinha”.
E do “Homem do Baú”!? Ah! Silvio Santos sempre foi uma presença constante na casa de meus pais, um daqueles rostos familiares que, de alguma forma, parecia fazer parte da minha família. Seus bordões inconfundíveis – “Quem quer dinheiro?”, “Bem bolado, bem bolado!” – não eram apenas frases ditas no calor do momento; eram parte de um ritual que unia gerações em frente à TV, criando um laço invisível entre nós e aquele homem de voz marcante e sorriso largo.
“Quem quer dinheiro?” – ele perguntava, e, com essa frase, não era só o prêmio em jogo, mas a ideia de que a sorte pode sorrir para qualquer um de nós, que todos temos uma chance, desde que tenhamos coragem de nos arriscar. Silvio, com sua maneira única, me ensinava que a vida é feita de oportunidades e que, por trás de cada brincadeira, havia uma lição de generosidade, resiliência, e, acima de tudo, de otimismo.
Esses bordões, que eu ouvia tantas vezes, ainda ressoam dentro de mim, trazendo à tona lembranças de uma época em que o domingo era sinônimo de riso e descontração e, mais importante, era domingo de família!
Esses artistas, com sua carisma e talento, ajudaram a criar um mundo onde me sentia mais segura e feliz, mesmo que por algumas horas. Eles eram a companhia constante, os rostos amigáveis em uma época em que a vida parecia mais simples e cheia de possibilidades. E é por isso que, quando me despeço deles, é como se uma parte da minha infância, da minha juventude, também se fosse.
Porém, mesmo que esses momentos estejam cada vez mais distantes, eles nunca desaparecerão por completo. Eles vivem em cada lembrança, em cada vez que me pego repetindo uma frase, em cada sorriso que surge ao lembrar de um episódio ou de uma canção. Porque aqueles momentos, quando foram vividos, outras pessoas estavam comigo e, ao relembrar, parece que elas se aproximam mais ainda de mim, ficam tão próximas que posso até sentir seu cheiro e ouvir sua gargalhada. E o passado se torna presente. É mágico!
Acredito que as memórias afetivas são eternas, porque elas não pertencem apenas ao passado, mas continuam a influenciar nosso presente e a moldar nossa visão do futuro. E enquanto as mantivermos vivas em nossos corações, esses artistas continuarão a brilhar, iluminando nossas vidas como sempre fizeram e nos permitindo revisitar o passado como se fosse o presente.
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